Toda tarde, existe um
de meus repetitivos pousos à janela que sempre se depara com a figura de uma
senhora num dos prédios ao fundo do meu. Ela está sempre a fumar, sempre em
mesmo horário, sempre contemplando a rua. Já lhe sorri algumas vezes, mas a
distância é considerável e não acredito que eu seja mais interessante que todo
o universo que ela tem a observar.
Há algo de intrigante
no saborear de suas tragadas diárias. Muito menos nelas em si, que na minudência
com que observa a rua. Não é uma senhora jovem, nem velha. Tem um cabelo amarelo-ovo
emplumado que lhe retrocede algumas décadas no tempo. Mas nada disso convém,
pois o que me importa apenas é saber o que rebenta das reflexões de sua cabeça.
E, nisso, percebi
nascida em mim o capricho de gravar-me naquela mulher.
Uma vez deitei-me com
um rapaz que era apaixonado em saber dos outros. Tudo o que queria, perguntava.
Era uma verdadeira esponja de saberes – inda que também amasse falar de si. Ele
insistia que eu carecia de egoísmo. Não num sentido perverso, é claro, mas no
intento de pensar menos nos outros e mais em mim. Um individualismo do bem. Do
que não tiro parte de seu mérito, aliás.
Ocorre que não é nato
em mim o propósito clarividente de absorver das pessoas o quanto têm a me doar.
Meus poucos e arrastados anos foram feitos de absorções casuais, como que
acessórias a um laço maior estabelecido, antes, por mim. O que sei, de fato, é
imprimir-me em todo canto que passo. Canto, coração, alma. Sei que deixo sempre
vestígios (ou cicatrizes) de mim. Prefiro deixar-me em outrem a, antes, tomá-los
de si.
Sobre a senhora da
janela, quero conhecer suas notas mentais mais latentes; porquanto, sabendo, permitir que também ela saiba sobre mim.
Vc é muito linda, mulher!!!
ResponderExcluirEstá nos olhos de quem vê!
ExcluirObrigada pela visita. (: