domingo, 27 de maio de 2012

Doncovim - Parte 2

E aí vem a minoria – ainda que basta – que sabe de si minoria. Aqueles que conseguem enxergar as raízes podres de sua terra. E adoram consegui-lo!
Sentem-se únicos, sentem-se especiais. Absolutos!
Descobrem-se à parte e, à parte, constroem-se. É mais bonito. O diferente que vale à pena. “Quem não é como eu, não é”.
E, seguindo duas próprias diretrizes fixas, moldam-se realmente diferentes. Daqueles. Porque, entre si, são apenas encaixes pré-moldados que se perpetuam. Um monte de gente diferente, uma igual à outra. Os mesmos livros, os mesmos discos, os mesmos filmes, as mesmas opiniões. Arte, cultura, alternatividade... Vão temer afirmar que lhes agradam outros sabores. Melhor absterem-se na segurança que é dizer não conhecerem o que extrapola seus gostos premeditados.

Gosto do que eles afirmam digno gostar.
Eles quem? Quem dita sua arte?
Não me faça perguntas difíceis. Já está dito que isso é que é bom, então é isso que sou!

Aperta-me o peito de saudade dos tempos que inocência e ignorância permitiam-me a liberdade de admirar o que eu considerasse merecedor de apreciação. Agora tenho notícias, revistas, livros e personagens mil, ditando vestes, comportamentos, gostos e opiniões que devo nunca esquecer de ainda ter para mim.
As opiniões… Meu medo são as opiniões.
Esses seres atípicos, meu Deus!, aos olhos de fora são apenas cópia de uma cópia de uma cópia. Julgam da mesma forma com que são julgados, mas se percebem tão mais dignos! Afirmam-se tão seguros, são tão eficientes em se auto-propagandear, que é quase crível que não seguem ou não se importam com moldes a suas personalidades, em serem imitações vivas dos personagens os quais foram mandados idolatrar.
Diferente por diferente, a única coisa que me resta são exércitos de clones. Cada qual de sua forma, cada um com suas convicções. Mas todos iguais.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Doncovim - Parte 1

Terra envelhecida por coronéis engrandecidos de orgulho. Encharcada de conservadorismos hipócritas. Lá, não se deixa de fazer porque não se quer, mas porque não se pode deixar ver. É preciso muito cuidado com os olhos atentos, afinal: reputação não é coisa com que se brinca. Os olhos do outro prevalecem sobre a minha verdade.
Lugar onde só cabem abastados, inda que se edifiquem os tronos pelas mãos pobres calejadas, ásperas e sujas de terra. É Orange County do sertão brasileiro. Nata que engordura a sociedade.
Seus herdeiros vivem outra realidade – ou são membros da realeza, com suas roupas mais nobres e seus carros mais respeitáveis, ou são revolucionários demais, fumando erva comprada com a mesada do papai. Viagens, presentes, festas: são personagens de filme, demasiado originais para se encaixarem numa realidade brasileira típica – “sou mais um estilo londrino”, disseram. Para todo desvio de roteiro, há solução (ainda que seja mandar matar aquele namorado secreto do garanhão da família).
As moças morrem de orgulhos de suas virgindades, fazendo sobre elas publicidade maior que a pureza que de fato detêm. Se pudessem renová-las de tempos em tempos, fá-lo-iam sem pensar duas vezes. Para que revolução sexual àquelas que seduzem seus machos com encantos tão próprios – e tão utópicos – quanto os das intocáveis donzelas dos contos de fada? Mais vale um currículo sexual digno que um bom livro de cabeceira.
É terra de dedos em riste, onde quem aponta não se vale de valores tão valiosos assim. Cidade que estupra meus sonhos, violenta minhas fantasias. Faz da esperança criatura fantástica digna de escárnio.
É lá, é lá. E já faz parte de mim.