terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Rugas

Antonieta se sentou no banco da praça, esperando não sabia o que passar, e passar feliz, para que ela lhe pudesse sugar um pouco e ser ligeiramente mais feliz também.
Excepcionalmente, naquele dia, esperou sem ansiar.
Entre o fim do primeiro cigarro e o acender do segundo foi que sentou ao seu lado senhora gorda, com lenço no cabelo e enormes joanetes florescendo entre os dedos dos pés sujos, secos e grossos.
Engraçado. Para Antonieta, cada joanete combinava com alguma ruga da testa ou circunscrita aos olhos, de onde parecia nascer o cheiro de uma história diferente. Uma por cada prega.
Achou curiosamente bonitos os sulcos que a pele ia formando e foi, telepaticamente, lendo a vida daquela senhora, que como qualquer uma, mas à sua bem calosa maneira, já havia sido menina, moça e mulher.
Ao se dar conta de que era admirada, não demonstrando surpresa, ela sorriu. Sorriu mais com as rugas dos olhos – e suas memórias – que com a própria boca.
Antonieta apagou o cigarro, ergueu-se e partiu. Foi para casa. A felicidade já havia lhe visitado.

5 comentários:

  1. Que texto lindo! Quanta inspiração! Gostei muito desse, Júlia, me fez refletir bastante. Parabéns!

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    1. Lauritcha, você não faz ideia da paz que eu sinto ao ler isso!
      Não por orgulho próprio, mas por ter conseguido fazer alguém traduzir para si mesmo reflexões que, noutro momento, fui eu quem fez. É a melhor recompensa! (:

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  2. Quanta sutileza demonstrando grandes sentimentos. Isso que é vida, Jú!

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    1. Ju, reconhecimento seu, tão culto e tão sabido, é prêmio em dobro. Juro. ;)

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  3. Como estou lendo isso só agora? Que texto maravilhoso! Faça um favor para a sociedade e continue escrevendo sempre!

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